Corrupção Cultural
Boa tarde,
O meu nome é Tiago R. Santos. Gostaria de lhe chamar a atenção para uma notícia divulgada no jornal 'O Independente', a 30 de Setembro de 2005.
"Júri do ICAM muda decisão para apoiar Manoel de Oliveira"
Começo por afirmar que fui parte prejudicada neste processo. Escrevi o argumento para o "Call Girl", projecto de António-Pedro Vasconcelos e Tino Navarro, que foi excluído como consequência das movimentações e influências do Sr. Manoel de Oliveira. Mas não lhe escrevo para me queixar. Gosto de pensar que o faria também se o concurso nos fosse favorável. Isto é, na verdade, um alerta.
Se a notícia é verdadeira, e não existiram desmentidos até à data, há várias questões pertinentes:
1- Como é que o Sr. Oliveira teve conhecimento do resultado de um concurso antes de as actas e classificações serem oficiais?
2- A quem é que o Sr. Oliveira falou para exercer pressão sobre o júri? Considerando o sucesso da 'operação de bastidores', não será um exercício de imaginação supor que falamos de alguém com peso político considerável.
3- Sendo que falamos de dinheiros públicos, não poderá esta 'operação de bastidores' ser classificada como sendo 'trâfego de influências', um crime punido por lei?
4 - O presidente do Júri, o Sr. António Cunha, é o director da Videoteca Municipal de Lisboa. Outros dos elementos do Júri é a Sra. Isabel Ruth, que já participou em sete filmes do Sr. Manoel de Oliveira. Não haverá, neste último caso, conflito de interesses? Serão estas as pessoas mais qualificadas para ajudar a decidir quais os filmes produzidos em Portugal? Olhar para a constituição dos júris, perceber a sua subjectividade e, porque não dize-lo, incompetência, é começar a decifrar as razões do divórcio entre o público e o cinema português. Apenas entre 0,4% e 1% dos espectadores de cinema em Portugal assistem a produções nacionais.
5- A nova Lei das Artes do Cinema e do Audiovisual entrou em vigor em 18 de Setembro de 2004. Ainda não foi regulamentada. Porque? Os objectivos centrais do novo diploma eram "o apoio ao desenvolvimento sustentado da produção" e "a criação de um tecido empresarial". Quem é que perderia com esta nova lei? Talvez aqueles que estejam confortáveis com o actual estado de coisas. Falamos de pessoas que vivem na garantia de dois subsídios por ano e na irresponsabilidade de quem gasta 650 mil Euros num filme visto, em muitos casos, por menos de cem espectadores.
Muitas outras questões ficam por fazer. Sei também que este é apenas mais um episódio de uma história triste. Um país define-se pela sua cultura e, nesse aspecto, Portugal está podre. Esta não é uma meritocracia. Não é sequer uma Democracia. É o país do Status Quo. Não há lugar ao dinamismo cultural, às novas ideias ou a talentos emergentes. Mas este não é o alerta. O verdadeiro problema é que vamos desistindo. Alguns saem do país, como exilados culturais. Os que ficam são atacados pela estupidez do sistema. A criatividade deixa de existir. Ligo a televisão, abro um livro, entro numa sala de cinema escura e vazia, e sei que a batalha está perdida. Estamos em inferioridade numérica e não temos aliados. A ficção portuguesa está morta. E como é uma guerra invisível, ninguém dá por isso.
Boa tarde,
O meu nome é Tiago R. Santos. Gostaria de lhe chamar a atenção para uma notícia divulgada no jornal 'O Independente', a 30 de Setembro de 2005.
"Júri do ICAM muda decisão para apoiar Manoel de Oliveira"
Começo por afirmar que fui parte prejudicada neste processo. Escrevi o argumento para o "Call Girl", projecto de António-Pedro Vasconcelos e Tino Navarro, que foi excluído como consequência das movimentações e influências do Sr. Manoel de Oliveira. Mas não lhe escrevo para me queixar. Gosto de pensar que o faria também se o concurso nos fosse favorável. Isto é, na verdade, um alerta.
Se a notícia é verdadeira, e não existiram desmentidos até à data, há várias questões pertinentes:
1- Como é que o Sr. Oliveira teve conhecimento do resultado de um concurso antes de as actas e classificações serem oficiais?
2- A quem é que o Sr. Oliveira falou para exercer pressão sobre o júri? Considerando o sucesso da 'operação de bastidores', não será um exercício de imaginação supor que falamos de alguém com peso político considerável.
3- Sendo que falamos de dinheiros públicos, não poderá esta 'operação de bastidores' ser classificada como sendo 'trâfego de influências', um crime punido por lei?
4 - O presidente do Júri, o Sr. António Cunha, é o director da Videoteca Municipal de Lisboa. Outros dos elementos do Júri é a Sra. Isabel Ruth, que já participou em sete filmes do Sr. Manoel de Oliveira. Não haverá, neste último caso, conflito de interesses? Serão estas as pessoas mais qualificadas para ajudar a decidir quais os filmes produzidos em Portugal? Olhar para a constituição dos júris, perceber a sua subjectividade e, porque não dize-lo, incompetência, é começar a decifrar as razões do divórcio entre o público e o cinema português. Apenas entre 0,4% e 1% dos espectadores de cinema em Portugal assistem a produções nacionais.
5- A nova Lei das Artes do Cinema e do Audiovisual entrou em vigor em 18 de Setembro de 2004. Ainda não foi regulamentada. Porque? Os objectivos centrais do novo diploma eram "o apoio ao desenvolvimento sustentado da produção" e "a criação de um tecido empresarial". Quem é que perderia com esta nova lei? Talvez aqueles que estejam confortáveis com o actual estado de coisas. Falamos de pessoas que vivem na garantia de dois subsídios por ano e na irresponsabilidade de quem gasta 650 mil Euros num filme visto, em muitos casos, por menos de cem espectadores.
Muitas outras questões ficam por fazer. Sei também que este é apenas mais um episódio de uma história triste. Um país define-se pela sua cultura e, nesse aspecto, Portugal está podre. Esta não é uma meritocracia. Não é sequer uma Democracia. É o país do Status Quo. Não há lugar ao dinamismo cultural, às novas ideias ou a talentos emergentes. Mas este não é o alerta. O verdadeiro problema é que vamos desistindo. Alguns saem do país, como exilados culturais. Os que ficam são atacados pela estupidez do sistema. A criatividade deixa de existir. Ligo a televisão, abro um livro, entro numa sala de cinema escura e vazia, e sei que a batalha está perdida. Estamos em inferioridade numérica e não temos aliados. A ficção portuguesa está morta. E como é uma guerra invisível, ninguém dá por isso.
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